A tarde havia sido intensa, mas bem produtiva e feliz na escola em que trabalho. Ainda envolta pelos momentos mais que gostosos vividos com as crianças, já observava a troca de pensamentos, lembrando-me e listando o que teria a fazer: passar no supermercado, comprar isto, aquilo, não esquecer daquilo outro, chegar em casa e dar andamento em um plano que havia surgido há alguns dias para aquela noite: um jantarzinho especial para os filhos!

E lá vou eu toda feliz, no embalo de tantos sentimentos – daqueles que havia vivido à tarde e dos que me aguardavam viver em casa. Caminho em direção ao carro. Porém, antes de abrir a porta, noto com espanto um grande amassado bem na ponta do capô. Mal podia acreditar! Fico estática por alguns segundos, ainda como que conferindo se era mesmo o meu carro.

Com a rapidez de um bólido, muitos pensamentos ocuparam o lugar dos doces sentimentos que me acompanhavam. Para onde eles teriam ido? Ah, sim! Estavam bem espremidinhos em algum canto dentro de mim, enquanto os pensamentos bradavam: “Que absurdo! Como alguém tem coragem de fazer isto? Bate no seu carro e vai embora… Nem um bilhete e nem nada… blá, blá,blá”.

Como se ainda tivesse a esperança de que alguém aparecesse, os pensamentos resistiam a que eu entrasse no carro e saísse logo dali.

Quando finalmente consegui entrar e já mais serena, silencio a mente e volto a me recordar do supermercado e do quanto queria viver os momentos planejados com os filhos. Foi o que bastou para chamar de volta os sentimentos que, como forças existenciais da natureza humana, entraram em ação, levando-me a refletir e colocar as coisas em seus devidos lugares.

Respiro resignada e vou para o supermercado. No caminho, sinto um confluir de mente e coração, e na conversa entre ambos, com muita bondade e amplidão, escuto: “Mas olha, não deixe que este pequeno incidente ofusque a alegria com que ia para casa e, menos ainda, que estrague seus planos de viver os bons momentos com os filhos tão queridos. Afinal, foi só um pedaço de lata amassada, portanto não pode ser mais importante do que o que sentia ao deixar a escola e ir para casa. O que vale mais?”.

“Foi só um pedaço de lata amassada – o que vale mais?”

– aquelas palavras calaram fundo em mim. De um lado, a razão discernindo, julgando e colocando as coisas em suas devidas proporções. Do outro, a sensibilidade restaurando o equilíbrio interno. A força de ambos juntos promovendo um estado tão, mas tão distinto de instantes atrás, agora já elevado e tranquilo. O amassado ficou muito pequeno, e o que realmente tem valor na vida ficou muito, muito grande.

Que maravilha foi livrar-me de vez daquele mal-estar e sentir vibrando dentro de mim toda a boa disposição, a alegria e a vontade ainda maior de chegar logo em casa. Mas estava decidida: não contaria aos filhos sobre o amassado. Não naquela noite!

Ao contrário, desfrutamos intensamente daqueles momentos, e entre recordações, assuntos amenos e elevados, dentro de mim contemplava com imensa gratidão todo o vivido, e bem sabia que o desfecho poderia ter sido bem diferente, se não estivesse aprendendo tanto sobre a vida interna. Não tinha dúvida de que vivi isso porque estudo Logosofia.