Quem vive sem um ideal carrega a morte sobre os ombros. (Introdução ao Conhecimento Logosófico, p. 217)
Caminhando pelas ruas do bairro onde fiz faculdade, vi-me tomada por uma série de lembranças da juventude. Tempo que vivia à procura de um ideal, o que me fez uma jovem participativa dos movimentos estudantis e adepta das filosofias de vida voltadas às questões humanitárias. Parece que ainda ouço o alvoroço para o início das reuniões no DCE – Diretório Central dos Estudantes – da minha universidade; escuto as pautas voltadas às mobilizações em prol de uma política liberal, reuniões de debates acalorados com o objetivo de levantar questões e propor meios para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Foi assim, na ânsia de encontrar e lutar por algo verdadeiramente grande, que ingressei em persuasões ideológicas, culturais e religiosas que quase alienaram minha consciência.
Sempre vi beleza em fazer o bem, o bem em si. Jovem idealista e inconformada, segui minha juventude aderindo a ideologias e seitas que me levaram a mudar meu estilo de vida e confrontar meus pais. Alguns institutos culturais próximos à Praça da Liberdade, na cidade onde ainda moro, eram pontos de encontro de jovens idealistas que queriam transformar o mundo. Nas manhãs de domingo, após os famosos concertos para juventude no Palácio das Artes, conhecia novas e diferentes ideias sobre a vida e o mundo.
Ali tive a oportunidade de conhecer alguns filósofos e líderes religiosos da época. Por trás de um discurso socialmente aceito, buscava-se jovens seguidores, escravizava-se mentes em ideias fundamentalistas que os impediam de pensar. Passei pela intenção de atender meus anelos de uma vida útil e digna à militância partidária.
Encontrei uma miscelânea de teorias em meu trajeto inquieto, até conhecer e decidir-me a estudar Logosofia. Foi um levantar a poeira interna bem grande: comecei a discernir entre o jogo de especulações políticas, filosóficas, psicológicas e metafísicas e o desenvolvimento de meus recursos internos, minha mente e sensibilidade, como aptidões naturais que poderiam ser superadas na busca da verdade pelo conhecimento. Foi quando pude estabelecer a diferença que existe entre os valores da ilustração e os do conhecimento transcendente.
Não foi fácil desprender-me das flores das ilusões! Não foi fácil mover meu maravilhoso mecanismo mental em busca dos grandes conceitos — frutos das altas idealizações da Inteligência Criadora da vida e do Universo. Nesse momento, começava a criar o substrato moral necessário para forjar um “verdadeiro ideal de vida”, começava a arte de criar a mim mesma, começava a vencer a morte.
As recordações levam-me a refletir sobre o quão preocupante é o universo das ideias e ideologias que surgem no entorno da cultura juvenil, correntes intelectuais, culturais, espiritualistas, especialmente as que se relacionam com os domínios do pensamento e da psicologia humana, sem que de sua seleção tenham surgido ideias de evidente acerto a respeito da condução do homem em suas íntimas aspirações de aperfeiçoamento.
Só com o tempo aprendi sobre a diferença entre ideologia e idealismo. No “senso comum”, a ideologia é um conjunto de ideias e crenças organizadas que formam a intelectualidade humana, e o idealismo é uma visão utópica da vida material, uma idealização da realidade. Ambos terminam por se confundirem, gerando sectarismos e defraudando os rumos de muitos jovens. A partir dos pensamentos ideológicos e, por outras vezes, dos pensamentos idealistas, o ser humano mantém-se, ao longo dos séculos, preso em uma realidade circular. Cercado de ideias importantes, mas circunstanciais, próprias de uma época, não conseguindo transcender os conhecimentos comuns até chegar ao conhecimento de si mesmo para poder descobrir e forjar um ideal de vida – um ideal não mais materialista, mas um ideal metafísico e transcendente de vida . Falo aqui da vida que pode, pelo seu alcance, influir no destino do ser humano, um destino mais em sintonia com suas prerrogativas.
Agora, já sexagenária, compreendo que não é por ter contabilizado anos de vida física que envelheço. Envelheço porque me afasto do ideal superior, dominada pelo véu das crenças e paixões que me afastam das energias que renovam a vida. Envelheço quando vou encurvando a alma ao ir deixando de pensar…, pensar útil e grande. Ensina a Logosofia: “Quem vive sem um ideal carrega a morte sobre os ombros”. Enquanto me encanto com a vida e maravilho-me com as descobertas que faço de mim mesma, humana parte de Deus, a juventude permanece morando em mim.
Compreendo, na atual etapa das minhas investigações, que o verdadeiro ideal é inexpugnável quando dele surgem os conhecimentos e sentimentos que dão conteúdo ideal à vida, dão conteúdo às expressões da alma que busca seu espírito, para que ambos, em uma história de amor, vivam o eterno transcender da evolução humana.
O ideal fez-me descobrir que é possível a imortalidade em vida!
O ideal é aquilo que cada um forja como estímulo poderoso para conquistar o que se propõe. Se esse ideal é superior, o espírito ascenderá à medida que o ser avance para as metas superiores… (Introdução ao Conhecimento Logosófico, p. 217)