Na minha adolescência eu tinha uma amiga que chegava nos lugares com um largo sorriso, falando alegremente e contagiando a todos. Ela nunca desviava o olhar, não ficava vermelha ao falar e era muito segura de si. Como eu a admirava! Ela era tudo o que eu queria ser.
Ao contrário dela eu chegava desviando os olhares, ficava vermelha ao ter que falar com estranhos, era completamente insegura e a possibilidade de fazer algo errado me aterrorizava.
Sim, eu era assim… Tímida, muito tímida!
A timidez era tão forte que eu deixava de aproveitar festas, passeios, falar com pessoas interessantes e perdia muitas oportunidades. Às vezes pensava: será que nasci para ser assim? E sonhava em ser como minha amiga: alegre, extrovertida, falante, segura.
Quando comecei meus estudos de Logosofia, fui me apropriando de muitos conceitos, entre eles que as deficiências psicológicas são pensamentos negativos enquistados em minha mente e que impedem meu livre pensar e atuar de forma natural, tranquila e serena. Descobri então que poderia mudar meu jeito de ser, que não havia nascido para ser tímida, pois essa não é uma característica do espírito humano. Poder mudar meu jeito de ser significava que eu poderia vir a ser como minha amiga, que expandia alegria a todos a sua volta.
Pecotche, no livro Deficiências e Propensões do Ser Humano, p. 72, ensina que a timidez:
“reflete um estado de abatimento do ânimo, que inibe o ser em seu trato com os demais, prejudicando quase sempre o valor das próprias aptidões, que ficam diminuídas e até negadas pela coibição que ele experimenta tanto ao falar como ao atuar.”
Era exatamente assim que me sentia: inibida, sem valor, diminuída diante de tudo e de todos. Eu negava a mim mesma como um ser que possuía valores. Nem mesmo sabia quais eram minhas aptidões! Seria verdade que eu as tinha?
A primeira interrogação que o estudo me despertou foi a de querer saber as causas, em mim, desse pensamento ter tanta força. Como e quando essa deficiência que me fazia covarde, inibida, insegura se infiltrou em minha mente?
Aprofundando na investigação logosófica descobri que esse pensamento tem sua origem na infância e que qualquer criança pode contrair a timidez quando sua espontaneidade fica prejudicada e “(…) não se lhe brinda o apoio de que necessita para crescer livre de temores, confiante em suas forças e na capacidade que desenvolva.” p.72 Pelas circunstâncias da própria vida eu havia crescido cheia de temores e insegura. Os adultos que me cercavam, embora percebessem essa característica em mim, careciam de conhecimentos para me ajudar a combater tal pensamento.
Mas ainda me faltava entender por que esta deficiência era tão forte a ponto de inibir meus movimentos mentais e sensíveis, fazendo-se sentir até no físico. Percebia que em outros seres ela se apresentava de forma mais branda.
Pecotche ensina que a criança que é “ (…) acanhada por natureza, a criança tímida, seguramente agravará seu mal se se procede com ela inadequadamente.” p.73 Esse ensinamento me fez refletir que como ser existencial, que colhe experiências nesse mundo e arquiva as impressões e sensações na célula hereditária, custodiada pelo próprio Espírito (livro O Espírito), eu cheguei a este mundo com a bagagem da timidez na mala da herança. Isso responde porque a timidez se apresentou muito cedo e com uma característica marcante de minha psicologia.
Com essa característica me tornei adulta e a pressão dessa inibição se delineou como complexo de inferioridade. Restava-me agora, para deixar de ser tímida, aprofundar os estudos para combater essa deficiência que me fazia sofrer desde a infância. Deveria seguir o que ensina o axioma logosófico:
“Para chegar a ser o que não é, deverá principiar por deixar de ser o que se é.”
E eu estava disposta deixar de ser tímida!
“(…) é preferível conhecer que inimigos temos dentro, para combatê-los com lucidez mental, a ignorá-los, enquanto ficamos à mercê de sua influência despótica, suportando docilmente a maioria dos desgostos e depressões que diariamente nos ocasionam.”
(Deficiências e Propensões do Ser Humano-DPSH, p. 14)
Após ter conhecimento de que poderia combater o pensamento da timidez que me acompanhava desde a infância e que poderia deixar de ser inibida, temerosa e insegura diante dos semelhantes e da Vida, criei, conforme ensina Pecotche, um nobre propósito: formar um novo jeito de ser e estar no mundo. Não queria mais perder sorrisos, oportunidades, olhares… Queria ser naturalmente eu!
Dei início então a criação das ferramentas para enfrentar o pensamento. Era necessário que eu recolhesse todo ensinamento que me orientasse no sentido de combater e me defender das investidas da inibição. Segundo Pecotche (DPSH, p.74) eu deveria agilizar minha mente com o estudo, prática e conhecimento das atividades que desenvolvem os pensamentos dentro de meu próprio campo mental. Pois, desta forma, eu obteria como resultado um aumento gradual, e em proporção cada vez maior, de meu próprio valor, valor que se irá configurando pouco a pouco em ousadia.
Para conhecer as atividades do pensamento da timidez em meu campo mental, passei a observar, analisar e anotar seus movimentos: quando atuava, quando começava a se mover, o que eu sentia, como ele ia ganhando força, qual o efeito que produzia e o rastro que deixava para trás. Nada fácil se tratando de pensamentos, pois eles não são físicos. Mas, havia aprendido que “(…) apesar de sua imaterialidade, são tão visíveis e tangíveis como se fossem de natureza corpórea (…).” Então, com que olhos podem ser vistos? “(…) podem ser vistos com os olhos da inteligência e palpados com as mãos do entendimento, capazes de comprovar plenamente sua realidade subjetiva.” (Logosofia Ciência e Método, p. 56/2)
E em posse de conhecimentos, seguindo todas as orientações do Método Logosófico para a eliminação de um pensamento de influência negativa, dei início à aplicação da técnica para eliminá-lo de minha vida: conhecer, bloquear, debilitar e anular, (DPSH, p. 13) não sem antes selecionar um pensamento para dar início ao labor. Eu deveria substituir a deficiência da timidez pela antideficiência, uma eficiência chamada resolução.
Uma antideficiência “é o pensamento específico que selecionamos para conferir-lhe a missão de opor-se a determinada deficiência. (…) É um pensamento-polícia que deve ser instituído na mente com o objeto de vigiar, repreender e paralisar, temporária ou definitivamente, o pensamento-deficiência.” (DPSH, p. 19)
E aos poucos fui ousando, minha vontade foi se fortalecendo e operando sobre as faculdades de minha mente. Meu campo mental ganhou mais vigor e fui ficando valente, confiante, segura.
Muitos seres têm essa deficiência e em cada um ela se apresenta de maneira diferente, pois depende do quão forte é sua pressão sobre suas psicologias. Como em mim ela veio na mala da herança, eu tenho que estar sempre atenta a seus mínimos movimentos, pois mesmo já ter ela perdido sua força maior, ainda se manifesta sutilmente.
É todo um labor prático investigativo aplicado no interno de si mesmo que nós, estudantes de Logosofia, realizamos para nos conhecermos, para saber o que levamos dentro de nós mesmos – recursos, virtudes, deficiências. É um constante lapidar a si mesmo para sermos aquilo que queremos Ser.