Eis aqui um dos males psicológicos mais generalizados na atualidade.

Em épocas anteriores, a vida humana corria sem as premências, as preocupações e as exigências do presente. Os trabalhos rurais, o artesanato e as próprias funções estatais, então tarefas correntes, eram desempenhados sem a pressão do tempo. O relógio, tortura do mundo atual, não inquietava o homem, cuja existência se desenvolvia sem as demandas da urgência. Cada homem e cada povo vivia, pois, a vida a seu modo, embora não tivesse consciência cabal da forma de fazê-lo.

Os progressos técnicos que depois sobrevieram, os conflitos trabalhistas, o declínio da moral e, finalmente, a luta pela existência deram origem às inúmeras complicações que agora perturbam a vida.

Com o crescente desenvolvimento material, cujos avanços estimulantes nos surpreendem a cada dia, cresceram também, é inegável, as dificuldades e problemas que hoje enfrentamos, os quais, ao superexcitar o ânimo do homem, fazem com que ele caia irremediavelmente na impaciência. Em tal estado, qualquer demora ou inconveniente vinculado a preocupações ou responsabilidades fazem explodir o indivíduo, que a ninguém perdoa, e menos ainda ao causador do dano – causador verdadeiro ou suposto –, a quem atribui, é claro, tudo o que poderia advir em prejuízo de sua pessoa ou de seus interesses.

Hoje em dia, são poucos os que não experimentam os efeitos das mudanças ocorridas no mundo. Uns vivem angustiados pelo afã de não infringir nenhuma das tantas leis que regem a comunidade. Outros se veem acossados pelo problema econômico, da moradia ou do transporte. Os inconvenientes que surgem diariamente e as demoras suportadas sem pausa, com a consciência do tempo que se perde, aumentam, sem dúvida, o número de fatores molestos que incitam o ânimo e estimulam o impulso febril da urgência.

Diante da mesa do funcionário indolente e despreocupado, qual pessoa, mesmo a considerada paciente, não explode durante a espera, excitada por sua ostentosa passividade? Seguramente se conseguiria mais, nesses casos, antecipando a ele estas palavras: “Disponho de tempo, senhor. Atenda-me quando puder”, pois é comum encontrar no ânimo dos seres humanos certo prurido de fazer o contrário daquilo que lhes é pedido.

Inegavelmente, justifica-se que a impaciência se tenha convertido numa deficiência generalizada, que fustiga e perturba o sistema nervoso do homem.

A impaciência adquire, frequentemente, caráter de obsessão. Quando atinge tal extremo, qualquer espera, por curta que seja, assume no impaciente perfis de tragédia. Supõe que tudo se conjurou para torturá-lo, só respirando com satisfação quando vence algum contratempo.

O impaciente é um escravo do tempo, desse tempo fantasmagórico que nada tem a ver com o autêntico, que tão frequentemente o homem dissipa em banalidades, justamente por desconhecer seu valor real.

Esta deficiência cria, artificialmente, a angústia do tempo e faz viver em permanente agitação interna, sismo mental que impede instituir dentro de si a calma. Quem a padece vive sob a pressão constante de pensamentos que o impelem a apressar tudo quanto pensa fazer ou faz – como se existissem para ele prazos peremptórios em todos os seus afazeres –, e o mantêm em aguda aflição durante o tempo em que seu interesse se acha pendente de algo: uma notícia, uma resposta importante, uma solução, etc.

Além do muito que sofre moral e fisicamente, o impaciente malogra muitas oportunidades, projetos ou ideias que, caso seguissem um processo normal, se teriam transformado em êxitos rotundos, como coroamento de esforços conduzidos inteligente e pacientemente.

Na verdade, custa muito ao impaciente entender que cada coisa requer seu tempo, assim como lhe é difícil entender que aqueles que lhe prestam seu concurso, ou o secundam em seus esforços, nem sempre podem ou estão dispostos a seguir o ritmo que sua deficiência lhes pretende impor.

Que ganhamos sendo impacientes? Solucionaremos com isso o problema que as exigências desta deficiência nos criam? Formulemo-nos essas perguntas tantas vezes quantas experimentemos suas pressões e, seguramente, logo nos será fácil pôr em ação a antideficiência que corresponde aplicar, ou seja, a paciência inteligente*, que lhe tirará força e finalmente a vencerá. * Ver Logosofia. Ciência e Método, do autor.

Ao dizermos paciência inteligente, referimo-nos à paciência ativa. Não à que induz a esperar passivamente, mas sim à que, além de infundir serenidade, torna o homem compreensivo, permitindo-lhe pensar com utilidade e proveito, como também estar atento a suas necessidades e deveres durante todo o tempo, curto ou longo, abrangido pela espera.

A paciência é uma das virtudes mais valiosas e também mais difíceis de alcançar. Todavia, sua posse não é impossível, caso seja seguido rigorosamente o processo de compreensão, adestramento e realização que a porá ao nosso alcance.

Aplique-se cada um ao cultivo desta virtude e saberá cumprir com satisfação o mandato da vida.

Este texto foi retirado do livro “Deficiências e Propensões do Ser Humano”, que você pode baixar gratuitamente em PDF, clicando no link abaixo:

Deficiências e Propensões do Ser Humano

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Carlos Bernardo González Pecotche, também conhecido pelo pseudônimo Raumsol, foi um pensador e humanista argentino, criador da Fundação Logosófica e da Logosofia, ciência por ela difundida. Nasceu em Buenos Aires, em 11 de agosto de 1901 e faleceu em 4 de abril de 1963. Autor de uma vasta bibliografia, pronunciou também inúmeras conferências e aulas. Demonstra sua técnica pedagógica excepcional por meio do método original da Logosofia, que ensina a desvendar os grandes enigmas da vida humana e universal. O legado de sua obra abre o caminho para uma nova cultura e o advento de uma nova civilização que ele denominou “civilização do espírito”.