Fala-se muito da importância de o homem ter personalidade, como sendo isso um grande valor; e quando alguém fala da individualidade, alguns associam a isso uma atitude egoísta, por confundi-la com individualismo. A personalidade – a própria origem do nome, que vem de “persona”, aquelas máscaras do teatro grego, o indica – é aquilo que parecemos aos olhos dos demais. Ela é formada pela nossa figura física, estética, e por nossa educação e cultura voltadas para o externo. Buscamos refiná-la com o objetivo de exaltar nosso conceito pessoal diante dos demais.

Já a individualidade – voltando à pureza do conceito, o indivíduo é aquele que se diferencia da multidão anônima – é fruto da evolução, do cultivo das qualidades morais e psicológicas. 

O ser humano tem buscado sempre cultivar sua personalidade, para que sua aparência externa seja aquilo que desejou parecer frente aos demais. Para a Logosofia, entretanto, essa excessiva atenção à personalidade se opõe à realização interna. Os conhecimentos logosóficos estão destinados a formar conscientemente uma nova individualidade e se destinam a aumentar o saber, a experiência e os valores morais. 

Comumente se diz que o ser humano deve amar a si mesmo, e chama-se a isso de amor próprio. Por cultuar demais sua figura externa — que é a personalidade —, o que o ser humano geralmente ama é essa imagem externa e não a própria individualidade. Está mais preocupado com o que vai parecer aos demais do que com aprender com as experiências e acrescentar algo mais ao seu patrimônio interno. 

Dentro desse conceito, a Logosofia aponta uma falha psicológica ao que se chama de amor-próprio, e que é completamente diferente do verdadeiro amor a si mesmo. Essa falha não é tão fácil de ser identificada, pois muitas vezes atua em conjunto com outras. Vou relatar a vocês como a identifiquei pela primeira vez dentro de mim mesmo. 

Tendo sido sempre um bom aluno, eu possuía uma grande vaidade intelectual. Comecei a estagiar numa grande empresa, fui efetivado e depois de um ano o trabalho tornou-se rotineiro. Pedi demissão e me recoloquei com facilidade em outra boa empresa. Depois de um ano, tive um desentendimento lá e mudei rapidamente para outra. Percebi então que aquelas mudanças constantes não estavam bem e me propus a ficar na nova empresa por vários anos. Nela vivi, entretanto, a seguinte situação: meu diretor havia me prometido uma promoção, e com base nisso exerci interinamente o novo cargo por alguns meses, trabalhando até tarde todos os dias. Ao final, outro profissional foi indicado em meu lugar, e isso foi anunciado publicamente, na frente de todos meus colegas, sem que eu tivesse sido previamente avisado. Naquele momento, eu me senti envergonhado, e o sangue me subiu à cabeça. O que vocês acham que eu deveria ter feito? 

Na época eu estava estudando um ensinamento que dizia que “para a Logosofia, consciência é uma realidade à qual está alheia a imensa maioria dos seres humanos; alheia porque a ninguém ocorre que, para ser verdadeiramente consciente em todos os instantes da vida, é necessário que a nossa consciência esteja atenta e nos recorde que, para nos constituirmos em autênticos donos de nossa vida, devemos fazer dela uma sucessão de fatos felizes, que aumentem o valor de seu conteúdo”*.

Minha vontade, naquela situação que eu estava vivendo, era de pedir demissão imediatamente, como havia feito em situações anteriores. No meio daquela experiência, porém, recordei do que estava estudando e tive a lucidez de perguntar a mim mesmo se, ao pedir demissão, estaria fazendo da minha vida uma sucessão de fatos felizes, que aumentavam o valor de seu conteúdo. A resposta óbvia era “não”. O que estava, então, movendo-me a querer pedir demissão, se não a minha consciência? Pela primeira vez, surpreendi dentro de mim essa falha psicológica que é o amor-próprio. Era ela que me impedia de aprender com as situações que a vida me proporcionava. Era ela, também, que me tornava algumas vezes uma pessoa de convivência difícil. 

Orientado pela compreensão que eu havia alcançado naquele momento, não pedi demissão e tive a paciência de buscar minha recolocação profissional, que consegui após um longo ano. Soube depois, por outras pessoas, que aquele diretor continuou fazendo com outros o mesmo que havia feito comigo. Eu poderia continuar culpando-o pela situação difícil que havia passado, mas essa experiência foi importante para mim, pois evidenciou uma falha psicológica que eu precisava eliminar. Pude depois identificá-la atuando em outras situações da minha vida, e a partir de então realizei um trabalho para enfraquecê-la. Arrisco dizer que, depois disso, eu me tornei uma pessoa mais agradável para se conviver… 

* Trecho do livro “Curso de Iniciação Logosófica“, artigo 56.

Curso de Iniciação Logosófica

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