Li em um calendário que estava sobre a mesa de uma colega de trabalho o seguinte:

O acatamento inteligente do indivíduo a normas, regras, deveres e leis, contribui para estabilizar a harmonia na convivência humana

Achei aquela proposição interessante e comentei que eu havia gostado com essa colega. Ela, no entanto, ao ler, disse que não podíamos acatar a toda e qualquer regra, dando a entender que nem toda regra, dever ou lei é correta. “Mas veja”, repliquei, “o que diz aqui é que devemos acatar inteligentemente”. Ela, então, concordou.

Não obstante, após essa conversa, continuei a pensar sobre o assunto. Compreendi que a reação de minha colega deveria estar fundada no receio de que houvesse um cerceamento à liberdade, mas — ao fazer a ressalva de que o acatamento deveria ser inteligente — ela não apresentou mais objeções.

Indo além em minhas reflexões, pensei o que seria esse acatamento inteligente. Busquei exemplos em nosso cotidiano que me permitissem compreender melhor essa atitude. Não foi preciso ir muito longe. Já faz algum tempo que trabalho próximo à minha residência, o que me permite fazer o trajeto a pé. Essa mudança de hábito me fez viver as regras de trânsito do ponto de vista do pedestre. Passei a notar como os motoristas não respeitam o Código de Trânsito, e uma das minhas constatações diárias é o quanto os motoristas invadem a faixa de pedestres sem dar a menor importância para as pessoas que querem atravessar. Se o pedestre não apressar o passo, corre o risco de ser atropelado.

Eu mesmo, quando usava o carro com mais frequência, não dava atenção a essa regra. E o que me fez estar atento? Tudo mudou quando comecei a ir a pé para o trabalho. Hoje, quando estou dirigindo e vejo um pedestre querendo atravessar na faixa de pedestres, não tenho dúvida: diminuo a velocidade e dou-lhe a preferência. Mas há também o outro lado – os pedestres que atravessam a rua fora da faixa. Nesse caso, a lei não os protege. Isso, no entanto, não significa que ele não possa atravessar a rua, mas se o fluxo de carros for intenso, ou mesmo se ele estiver distraído, corre o risco de ser atropelado. Eu mesmo protagonizei esse drama anos atrás. A buzinada providencial me fez dar um pulo para a calçada. Sobrevivi, apesar dos protestos do motorista!

Esse exemplo tão simples me fez compreender o significado das palavras que li e mencionei no início deste texto. Eu posso acatar ou não uma regra, norma ou lei, mas não posso me eximir dos riscos que isso implica. A expressão acatamento inteligente faz toda diferença. Se eu desconheço a regra, norma ou lei, estou sujeito aos riscos provocados por minha ignorância. Existem leis criadas pelo homem e, também, as criadas pela natureza. Essas últimas o homem não consegue mudar, mas pode extrair muitos benefícios ao conhecê-las.

Dentre as leis humanas, há as que chamamos consuetudinárias, que se fundamentam nos costumes. Uma vez mais a afirmação que estava no calendário era precisa. O acatamento deve ser inteligente e, uma vez mais, é preciso ter conhecimento. Qual é o conhecimento de que necessito para acatar ou não um costume? Costumes há vários — uns são cultivados há milênios, outros apareceram mais recentemente. Há costumes que se praticavam no passado e que, hoje, foram abolidos pela sociedade. Será que os costumes de hoje serão abolidos pela sociedade futura?