Em substituição a uma docente, precisei assumir a regência de uma turma. Logo nos primeiros dias, percebi nos alunos a presença de um pensamento que poderia prejudicar o desenvolvimento das atividades e, até mesmo, o relacionamento deles com o professor. A cada proposta de deveres para casa, surgia o pensamento de queixa e, rapidamente, espalhava-se, ganhava força. Várias foram as minhas atuações no sentido de mostrar que, a meu ver, essa é uma rotina normal de uma sala de aula e que as tarefas cumprem o objetivo de fixar o que foi trabalhado, além de avaliar a aprendizagem. 

 

Numa sexta-feira, ao retornarmos do recreio, registrei a tarefa de casa no quadro. Essa ação desencadeou um turbilhão de queixas. Parecia que eu via tais pensamentos se moverem. Eles agitavam-se, agigantavam-se e vinham ao meu encontro. 

 

Eu virei-me para a turma e olhei aqueles rostinhos queixosos. Cada um parecia falar mais alto do que o outro, dando uma explicação e justificando, a seu modo, aquela recusa. Tive vontade de falar alto também e, de forma enérgica, conter aquela balbúrdia. Percebi que meu interno parecia um vulcão em plena erupção. Um pensamento em especial não queria calar: “Imponha-se ou perderá o controle da turma. Você deverá agir com energia! Faça valer sua autoridade!”. 

 

Reflexiva, guardei o pincel, usado para escrever no quadro, enquanto tentava observar o que se passava na minha mente, organizar os pensamentos e buscar uma solução. Detive aquele pensamento que tentava impulsionar-me para uma conduta inadequada e insensível. Mantive minha atenção ao que acontecia comigo mesma. Caminhei e desliguei a luz do ambiente. Voltei ao ponto de origem, sentindo meus pés moverem-se, compassadamente, num esforço mental enorme, cuidando também para que minha expressão facial fosse a mais serena possível. Parei e olhei a turma com ternura, permanecendo em silêncio. Queria ser observada por eles. Percebi o tom das vozes reduzindo. Em pouco tempo, a sala estava em total silêncio. Os ânimos serenaram. 

 

Pensei: agora é a minha vez. Preciso manter a serenidade, atenção e zelo com as palavras. Listei mentalmente as atividades que deveriam realizar no final de semana. Em seguida, calmamente, comecei a relatar as minhas tarefas de casa relacionadas com o meu trabalho: corrigir provas, calcular médias, planejar aulas, entre outras atividades. Ressaltei a importância da organização do tempo e do fazer com gosto. 

 

Naquele momento, passei a sentir um bem-estar indescritível. As palavras eram expressadas com naturalidade e, como um bálsamo, acalmavam a todos. Perguntei-lhes se seria correto chegar ao Colégio na segunda-feira sem o planejamento das aulas, e justificar para a coordenadora que os alunos teriam de brincar no horário das aulas, porque não cumpri minhas tarefas. Alguns esboçaram um riso passageiro. Outros disseram que não, eu não poderia agir assim. 

 

Passamos, então, a falar do aproveitamento do tempo para atender às várias atividades que executamos em nosso dia a dia e que nenhuma delas deveria ser deixada de lado em função de outra, já que cada uma tem sua necessidade e importância. Com calma e prudência, falei sobre a responsabilidade do aluno em cumprir com suas obrigações de estudante sem descuidar do lazer. 

 

Falei sobre as defesas mentais e da atenção que se deve dar aos pensamentos que às vezes nos levam a condutas inoportunas ; expliquei também como eliminá-los de nossa mente. Tenho certeza de que a observação e o conhecimento do que se passava em meu interno foram fundamentais na condução da experiência. Identificar os pensamentos e as deficiências presentes em minha mente naquele instante, diante das reações dos alunos, foi o diferencial. Verifiquei o princípio consciente ocorrendo naquele instante, ou seja, a discriminação entre os pensamentos e a função de pensar. 

 

A Sabedoria Logosófica orienta que:

“O princípio consciente do ensinamento logosófico radica, precisamente, nisso: uma vez que o ser humano sabe discriminar os pensamentos da função de pensar, nesse momento começa a funcionar o princípio consciente, tanto na criança como no adulto, porque é capaz, nesse momento, de perceber dentro de si o movimento dos pensamentos como entidades autônomas que antes dominavam a mente –  inclusive parecia que pensavam – sem se dar conta, muitas vezes, que muitos desses pensamentos, engrandecidos desde muito tempo, os conduziam por caminhos extraviados.” 

O autor da Logosofia, Carlos Bernardo González Pecotche, afirma que a mente infantil precisa de orientações, explicações e reflexões, quantas vezes forem necessárias, para ser amparada na formação de condutas mais elevadas.

 

O conhecimento do próprio mundo interno, dos pensamentos e sentimentos, favorece compreender melhor o outro e nos conduz a atuações mais sensíveis.