Na juventude, o desejo de ajudar os outros sempre esteve presente em mim, mas nem sempre soube como fazê-lo de forma verdadeira. Muitas vezes, tentava agradar alguém de quem eu gostava, resolver um problema para essa pessoa ou doar algo de mim — e, ainda assim, sentia que algo permanecia incompleto. Faltava entendimento. Faltava consciência.
Na concepção logosófica, o serviço ao outro não começa no gesto, mas no pensamento e no sentimento. Não se trata apenas de “fazer algo por alguém”, e sim colocar-se a serviço do bem verdadeiro, com consciência, desprendimento e esforço interno. Servir, para a Logosofia, é antes de tudo um ato de superação pessoal, pois somente ao aprender a servir a mim mesmo – cultivando valores, vencendo minhas próprias deficiências e produzindo um bem real em meu interno – poderei contar com uma produção excedente capaz de alcançar e beneficiar o meu semelhante.
Recordo com nitidez uma experiência que me marcou profundamente. Estávamos ensaiando uma apresentação com as crianças do setor infantil, em nossa sede cultural, e naquele dia tudo parecia conspirar contra. As crianças estavam agitadas e distraídas, com pensamentos de desobediência. A decoração do auditório, as bolas coloridas e o ruído ambiente tornavam quase impossível manter a atenção delas.
Procurei conversar com uma e outra, explicar a importância do ensaio e lembrá-las do propósito que nos unia. Algumas se sensibilizaram e tentaram colaborar, mas logo desanimavam diante da indisciplina das demais. Em dado momento, percebi que não apenas a situação parecia escapar ao meu controle, mas também eu começava a perder o domínio sobre mim mesmo.
Foi nesse instante que me lembrei do que havia estudado: que o servidor consciente não se deixa levar pelos pensamentos do ambiente, mas sim busca elevar-se internamente para poder influenciar o externo.
Respirei fundo e troquei o pensamento de frustração pelo de responsabilidade, chamando junto a alegria, que é um sentimento e uma força. E, a partir dessa mudança, comecei a agir com mais serenidade e foco. Em vez de me irritar, procurei estimular. Em vez de reclamar, procurei compreender. O resultado não foi mágico, mas algo mudou em mim e nas crianças. A reunião chegou ao fim e, embora o ensaio não tivesse transcorrido como o planejado, saí dali com a sensação de que tinha aprendido a servir com mais consciência.
A Logosofia me ensinou que servir verdadeiramente exige preparação interna. Não basta ter boa intenção. É necessário vencer a impaciência, o orgulho e o desejo de reconhecimento externo — pensamentos que facilmente se infiltram até nos gestos mais nobres.
Ao longo dos anos, percebi que o verdadeiro servidor:
- Observa a si mesmo constantemente, para não ser instrumento de deficiências psicológicas;
- Estuda e assimila conceitos que o ajudam a atuar com sabedoria;
- Não se impõe, nem se omite, mas oferece com respeito e dignidade o melhor que tem;
- Sente alegria real quando pode contribuir para o bem do outro.
Esse tipo de servir não cansa, não cobra e não se ressente. Ao contrário: fortalece, ilumina e eleva o espírito. E detalhe: mesmo que não seja correspondido, o bem já se produziu onde mais importa – dentro de nós, e não fora. Se aquele que recebeu o bem faz bom uso dele, a corrente é produtiva, e posso oferecê-lo novamente em outra oportunidade. Se não fez bom uso, ou egoisticamente guardou para si todo o benefício, então, inteligentemente, buscarei dedicar meu esforço de bem em outro campo, onde ele possa se produzir, se reproduzir, se ampliar e se multiplicar.
Servir ao semelhante com base na Logosofia tornou-se, para mim, mais do que uma prática: tornou-se um ideal de vida. Porque me mostra que o mundo muda quando meu ser muda — e que minha própria evolução não está separada da dos demais.
Aprendi que servir é uma forma de amar com inteligência. É um ato de entrega consciente. É, no fundo, uma forma de agradecer ao Criador pela oportunidade de viver, aprender e colaborar.