“Nós vamos ter que concordar: nós não nos entendemos!” Há alguns meses, foram estas palavras que encerraram uma grave conversa que tive com uma pessoa muito querida na minha vida. Do dissabor com esta afirmativa, surgiu no meu interno um grande propósito investigativo. Afinal, como não lograr êxito em entender e em me comunicar com uma pessoa por quem cultivo uma vinculação há anos?
Com o estudo da Logosofia, tenho aprendido a investigar primeiro o meu interno em busca de possíveis pensamentos, conceitos ou deficiências que sejam a causa dos meus conflitos e desentendimentos. O que, então, incomodava-me?
Após algum tempo de meditação, tive a impressão de falarmos linguagens distintas, embora sejamos adultos capazes e com pleno domínio da língua portuguesa. Parecia que as palavras quase nunca possuíam um significado igual para os dois.
Nas minhas recordações, encontrei pensamentos de rancor que foram surgindo ao longo dos anos, cujo objeto era comum: considerar que a outra pessoa não havia correspondido à altura aos meus gestos de afeto.
Ao observar o conjunto dessas pequenas reações projetadas no tempo, pude distinguir o que mais me incomodava nessa vinculação. Eu tinha a impressão de que não era ouvido. Não na linguagem corrente, mas sim numa outra, mais abrangente do que as palavras, que inclui gestos, orientações de conduta, surpresas e a manifestação dos sentimentos mais nobres do ser: a linguagem do afeto.
Mas como me instrumentalizar melhor nessa linguagem? O que estava afetando negativamente a minha comunicação com aquela pessoa tão querida?
Passei um bom tempo tentando encontrar uma resposta para esse enigma. Até que um dia, brincando com o meu cachorro, observei uma reação na minha mente que me chamou a atenção. Num dado momento da brincadeira, meu cachorrinho, em vez de trazer o seu brinquedo de volta para mim, começou a correr e a “jogar” o ossinho para longe. Esse comportamento fez surgir – ou melhor, pular – um pensamento de intolerância e de irritabilidade.
Esse pensamento manifestava-se assim: “Ora, eu separei uma parcela de tempo e de energia para me dedicar a ele. Quanta ingratidão! Por que ele simplesmente não faz o que me agrada?”
Como essa reação foi muito repentina, comecei a analisar a natureza daquele pensamento. Meu cachorrinho não estava fazendo aquilo por mal. Bastava olhar para ele para reconhecer quão divertida a brincadeira estava sendo aos seus olhos. Parecia que ele desejava que eu me divertisse tanto quanto ele, e estava expressando isso nos limites facultados pela sua própria linguagem de afeto.
Dessa experiência simples, eu extraí que muitas circunstâncias de conflitos e de desentendimentos com pessoas queridas surgem por uma tentativa minha de impor ao outro as formas de expressar afeto que eu mais compreendo e cujo valor considero mais elevado.
Algumas vezes, a incompreensão acerca das formas como outras pessoas expressam o carinho e a admiração pode chegar ao ponto de reagir às suas tentativas de compartilhar comigo o que há de mais puro no seu interno, simplesmente porque a forma escolhida não se encaixa no que espero.
Quando alcancei essa compreensão, o estudo e a prática da Logosofia veio novamente me ajudar. Aprendi que, para conseguir a mudança de um ambiente, primeiro devo ensinar a mim mesmo como mudar. Só depois posso levar os elementos do meu aprendizado ao outro.
Logo, antes de tentar ensinar uma outra pessoa o funcionamento da minha própria linguagem de afeto, eu precisava aprender a linguagem dela. A partir daquele ensinamento logosófico, propus a mim mesmo um exercício. A primeira etapa dele consistia em listar, para as cinco pessoas mais queridas para mim, pelo menos três formas típicas de cada uma expressar afeto.
De posse dessa lista, eu pude progredir para a segunda etapa, a de exercitar a minha estima pela linguagem própria de afeto de cada uma delas. Assim, venho experimentando escrever cartas em momentos especiais para as pessoas que se expressam por cartas, assistir a filmes com as pessoas que consideram essa uma grande forma de vinculação, e assim por diante.
Após meses de prática desse exercício, entendo que apreciar as distintas linguagens de afeto dos outros — exclusivamente a partir da minha linguagem de afeto — é como recitar os mais belos poemas em alemão para uma pessoa que domina apenas o mandarim. Não só ficaria prejudicado o entendimento, mas também poderiam surgir reações pela não compreensão.
Eis aí o grau da importância de me dedicar ao exercício da atenção para com as várias linguagens de afeto de quem me é caro. Por algo óbvio, uma pessoa tão importante pode acabar indo embora da minha vida.
Ainda não tive a oportunidade de fazer as pazes com a mesma pessoa que motivou todo o estudo que relato no presente artigo. Mas tenho confiança de que vou cultivar esse estudo dentro de mim com paciência, perseverança e o melhor da minha vontade. Assim, poderei um dia apresentar o que tenho de melhor com o objetivo de restaurar essa tão grata amizade.