Aprendi que surpreender minha realidade interna me ajuda a conhecer o que existe dentro de mim e modificar minha conduta. E assim aconteceu…

Eu tive uma lesão no ombro e o médico ortopedista recomendou como tratamento exercícios contínuos para aumentar a musculatura; isso diminui a dor que costuma ser insistente durante o dia e a noite. Para sair dessa situação, tomei a firme decisão de seguir as recomendações médicas com disciplina metódica.

Moro em um prédio com garagem pequena e sem demarcação de vagas. Muitas vezes, é necessário um manobrista para liberar os carros.

Dois dias na semana preciso sair de casa no máximo às 7h40 para ir à academia. E, para que não houvesse nenhum imprevisto, informei ao porteiro sobre meus horários para que, nesses dois dias, meu carro estivesse com saída livre pela manhã.

Logo na segunda semana, desci com o horário apertado e meu carro estava com a saída bloqueada… Eu estava tranquila, mas aquela situação provocou um turbilhão de pensamentos que ofuscou minha mente: intolerância, impaciência, pessimismo, irritabilidade, intransigência, autoritarismo, e muitos outros. Como assim? Se eu tinha avisado a portaria com tanta antecedência, por que o carro está bloqueado? Eu nem cumprimentei o porteiro, coisa que costumo fazer até efusivamente.

Flagrando a diferença de meu comportamento habitual, imediatamente, como um rebobinar de um filme, comecei a recordar tudo o que já tinha vivido naquele prédio com esse mesmo porteiro, que era tão querido. Além de ter participado do crescimento de meus filhos, desde pequenos, posso sempre contar com ele. E isso é recíproco.

No dia anterior, ele tinha me ajudado a resolver um problema que poderia ter me ocasionado muitos transtornos, e me senti muito grata por isso. O convívio com pessoas assim, solicitas, prestativas, generosas, torna a vida mais fácil, mais leve. Torna o mundo melhor, com sensação de mais segurança.

Frente a pensamentos mais bondosos que foram resgatando minha serenidade, pude constatar que, por um instante, era como se houvesse duas pessoas dentro de mim. Minutos antes, estava diante de uma pessoa ruim; segundos depois, eu era outra pessoa.

Tudo isso que, às vezes tem a dimensão de horas, passou-se em pouco mais de três minutos. Esse foi o tempo que Aristides demorou para liberar meu carro. Esse foi o tempo que ele me ocasionou de atraso.

O episódio me fez refletir sobre as consequências da falta de domínio sobre os pensamentos na vida. É quase inacreditável como os pensamentos conseguem ter total autonomia numa mente desavisada. Eles parecem tomar o domínio da mente e se expressam livremente através do comportamento. Aparentemente inofensivos — para quem não os conhece —, os pensamentos são capazes de levar a pessoa a cometer atos contra a própria vontade e podem chegar a comprometer a vida — e até mesmo a extingui-la.

Já vimos pessoas tendo sérios acidentes por distração ou negligência, negócios importantes malconduzidos pela falta de controle de alguns pensamentos, relacionamentos desfeitos também por causa deles.

A beleza de um trabalho consciente dentro de si mesmo, proposto pela Logosofia, dá maior estabilidade à vida; une as pessoas de forma mais concreta e definitiva. Porque a mente não cultivada é egoísta, separatista; desune.

Recordo de uma imagem de González Pecotche que diz que, enquanto o coração faz o cheque, a mente o rasga.

Eu me senti grata por tudo o que venho aprendendo. Observo que consigo ser muito mais consciente e ter as rédeas da minha vida nas mãos com muito mais frequência.

O que vivi foi uma das situações que se pode mudar pela atuação dos sentimentos.

Saí do prédio muito feliz, desejando ao Aristides um bom dia, ainda mais efusivamente! Ele nada percebeu da estória toda que se passou em minha mente e me respondeu como sempre: Bom dia, Dona Muriel! Olhe que lindo dia!

O sol brilhava mesmo, e o dia prometia.