Octavio: — Não faz muito tempo, tive a oportunidade de visitar um observatório astronômico e, convidado a contemplar a abóbada celeste através de um dos telescópios, pude observar que alguns astros têm atmosfera e outros não, sendo-me dito que nos primeiros se presume a existência de seres animados, enquanto que nos últimos só há natureza morta ou em estado caótico. Não sei se tudo isso terá alguma relação com nossa maneira de ser, mas o certo é que, movido por tal ideia, quis consultar o senhor a respeito.

Preceptor: — Nos espaços siderais — é sabido —, os astros, como os seres humanos no mundo que habitamos, agrupam-se em famílias. E tanto naqueles como neste há corpos ativos ou animados e corpos inertes ou sem vida. Os corpos ativos estão contornados por atmosfera, que estimula a vida e permite a absorção de oxigênio, que é seu elemento básico. Em nosso planeta, que é um corpo ativo e está, portanto, circundado de atmosfera, aparecem as espécies vivas, sendo a humana, entre todas, a de maior hierarquia. Pois bem; a vida humana, como a vida em geral, tem que se desenvolver procurando ampliar sua órbita, o que acontece através de vinculações, fatos e palavras.

O homem que se elevou por seu saber, seus esforços ou virtudes forma também sua atmosfera pessoal. Com o desenvolvimento de suas condições e das prerrogativas que vão se abrindo para ele, ao internar-se no campo das múltiplas atividades que pode desenvolver, essa atmosfera aumenta seu poder de irradiação, atraindo a simpatia e a amizade de muitos seres, do mesmo modo que os astros do sistema sideral, por sua influência cósmica, atraem outros para a sua órbita.

A respeito do ser carente de atmosfera pessoal, poder-se-ia dizer que tampouco ele tem vida, por carecer esta de conteúdo. Um homem assim também se acha privado de órbita, não pode irradiar vida e permanece inerte, estático, passivo, indiferente. Mas cria atmosfera, isso sim, todo aquele que irradia vida; forma sua própria órbita e, por influxo dela, procura atrair outros para formar a de seu mundo familiar.

Existe, pois, como expliquei, uma estreita semelhança entre o que acontece no mundo sideral e o que acontece em nosso mundo, porque todo o criado responde a uma evidente analogia.

Na ordem cósmica, uma outra semelhança altamente significativa nos é oferecida, e é que todo astro não atraído para órbita alguma se desvia, transformando-se em elemento estranho ao ambiente sideral, causa pela qual é finalmente repelido.

Octavio: — O caso dos cometas, não é mesmo?

Preceptor: — Nem mais nem menos. Perambulam pelos espaços do cosmo sem fixar seu destino. O mesmo ocorre com os seres rechaçados dos círculos humanos pela índole de suas modalidades, por sua conduta, sua maneira de ser, etc.

Prosseguindo com o pensamento da atmosfera pessoal, adicionarei que ela pode se ampliar, diminuir ou se esfumar, conforme o grau de evolução do ser. Essa atmosfera pessoal é tanto mais respirável quanto mais se enraíza, no conceito dos que estão vinculados ao que a gera, a ideia de sua integridade e da consistência de sua vida, na qual não deve existir o perigo de uma alteração que o leve a perder a própria órbita. Para assegurá-la, e também para que não se vicie sua atmosfera pessoal e se renove constantemente com a atividade sã e nobre que desenvolva, o homem tem a seu alcance todos os meios. É disso que cada um deve cuidar, tanto quanto cuida de sua vida, e diria mais: como se fosse sua razão de ser, de existir.

A sensatez e a franqueza são meios muito estimáveis de que o homem dispõe para manter sempre diáfana sua atmosfera pessoal, e para que nenhuma dúvida a ensombreça ou vicie. Quanto mais conscientes e íntegros são os seres humanos, tanto maiores são sua sensatez, sua lealdade e sua franqueza para encarar todas as coisas de suas relações comuns, por ser esta a norma invariável para afastar muitos males e limpar a atmosfera pessoal de toda possível perturbação de elementos estranhos. Quando se consegue isso, o ser brilha como os astros de luz própria, sem que nuvem alguma seja capaz de escurecer o céu azul de sua consciência.

Essa atmosfera pessoal, essa atmosfera interna, se reveste de uma multiplicidade de aspectos que se devem diferenciar para que o princípio possa ser aplicado. Se projetamos fazer determinada coisa, devemos criar uma adequada atmosfera interna. Tratando-se da realização de um estudo, por exemplo, cria-se a atmosfera propícia buscando e selecionando os pensamentos úteis a esse fim, sem que distração alguma conspire contra a sua continuidade, podendo ele realizar-se sem dificuldades. Do mesmo modo, se queremos nos proporcionar um prazer, devemos criar uma atmosfera de felicidade, de alegria, para que possa ser desfrutado sem que elementos estranhos perturbem esse ambiente feliz. Se quisermos realizar uma viagem, deveremos procurar também tudo quanto seja necessário para que essa viagem se cumpra sem inconvenientes.

A atmosfera interna pode transcender e tomar contato com os demais seres, sempre que quem a possua não viva isolado, pois nesse caso permaneceria estática. Mas, se busca a vinculação, pode acontecer que seja atraído ou repelido, conforme a índole simpática ou antipática de sua onda ou vibração. Eis, finalmente, o que vai determinando a órbita de atração pessoal.

Extraído de Diálogos, p.87


Carlos Bernardo González Pecotche, também conhecido pelo pseudônimo Raumsol, foi um pensador e humanista argentino, criador da Fundação Logosófica e da Logosofia, ciência por ela difundida. Nasceu em Buenos Aires, em 11 de agosto de 1901 e faleceu em 4 de abril de 1963. Autor de uma vasta bibliografia, pronunciou também inúmeras conferências e aulas. Demonstra sua técnica pedagógica excepcional por meio do método original da Logosofia, que ensina a desvendar os grandes enigmas da vida humana e universal. O legado de sua obra abre o caminho para uma nova cultura e o advento de uma nova civilização que ele denominou “civilização do espírito”.