Quando entrei na faculdade, constatei que o propósito de ter uma carreira de sucesso e destaque na profissão era bem disseminado entre todos os jovens. Com isso, o ambiente universitário se tornava bastante competitivo e, às vezes, até hostil. Então, seguindo os exemplos que eu observava nos colegas, comecei a trilhar a trajetória que achava que deveria seguir.

O problema que foi surgindo

Na minha área, é generalizada a ideia de que se você não está sofrendo, se não tem vários desafios em curso, se não passa por privação de sono, se não tem abundância de estágios extracurriculares, pesquisas e horas extras, você está fazendo algo errado, está ficando para trás. Bom, eu não queria ficar para trás. Afinal, quem quer?

Devido a esse medo de “ficar para trás”, fui fazendo tudo o que estava ao meu alcance e indo sempre além. Muitas vezes, indo inclusive além das minhas capacidades e ultrapassando todos os meus limites. E, veja bem, não sou contra uma competição saudável. Na verdade, acho que isso estimula as pessoas a buscarem mais e a não se contentarem com a mediocridade.

Contudo, com o tempo, comecei a ficar inquieta e infeliz. Eu gostava do curso e do que estava aprendendo, mas estava frustrada com o quanto a faculdade ia tomando conta dos meus dias, de forma integral.

Curiosamente, eu observava que mais ninguém no meu círculo de amigos e colegas de faculdade parecia incomodado com a situação, ou pelo menos ninguém falava sobre o assunto. Na realidade, nos encontros fora da faculdade, só se conversava a respeito da profissão.

Com o tempo, isso foi se tornando cada dia mais insustentável para mim, uma vez que eu nunca quis ser aquele estereótipo de pessoa cuja vida se resume ao trabalho. Entretanto, era exatamente isso o que vinha acontecendo: minha futura profissão estava se tornando a minha identidade.

Analisando a origem de minhas decisões

Comecei a me questionar:

  • Se eu não queria agir daquela forma, por que estava agindo?
  • Se eu não queria que toda a minha existência se concentrasse na profissão, por que me afundava cada vez mais nos compromissos da área profissional?
  • O que me impelia a realizar aquelas ações?
  • Quem estava determinando os rumos que eu deveria seguir? Era eu? Eram os meus pais? Meus professores? Meus amigos?
  • O que estava por de trás de todas aquelas decisões?

Nessa época, entrei em contato com o conceito sobre a realidade dos pensamentos, sua autonomia e influência nas nossas vidas. Compreendi que esses pensamentos poderiam ser próprios, quando originados pela real vontade do indivíduo, dependendo bastante de autoconhecimento, ou que eles poderiam ser alheios, quando originados na mente dos demais, e que, por serem autônomos, poderiam passar de uma mente para outra.

Assim, refletindo sobre o caminho que minha vida vinha seguindo, principalmente no âmbito profissional, verifiquei que minhas decisões não estavam sendo tomadas com base na minha real vontade ou nos meus próprios pensamentos, mas sim nos pensamentos do coletivo, da massa, do desejo de competição, de ser mais e melhor que os outros, de uma forma nada nobre.

A necessidade de criar uma identidade própria

Perguntei-me se eu estava convicta das escolhas que estava realizando e, após pensar muito, cheguei à conclusão de que não. Compreendi, como diz a música que ouvi há uns tempos atrás, que “camarão que dorme, a onda leva”, e a vida não necessariamente vai me levar para onde eu quero ir. Se eu quisesse ter uma identidade própria, à parte da profissão, teria que fazer um esforço consciente para cultivá-la.

Percebi que, para não ter dúvidas nas minhas escolhas, eu precisava nutrir em mim as condições e cultivar os conhecimentos necessários para estabelecer o caminho que gostaria de seguir, o que realmente era importante, e não o que os pensamentos do coletivo diziam que importava.

Minhas opções deveriam ser baseadas no saber, e esse saber baseado em verdades, e não em ilusões, no que Fulano fez ou porque Fulano disse. E fui constatando essas verdades através do minucioso estudo e busca pelo conhecimento de mim mesma.

A partir dessa reflexão, venho compreendendo que, primeiramente, tenho que almejar me conhecer melhor para saber quais são os verdadeiros valores de vida para mim, e por fim, reconhecer que quem manda em mim é sim um pensamento (ou vários), mas que se eu realizar esse processo de autoconhecimento, de forma consciente, aprendendo a explorar minhas limitações, meus anseios e a forma como funciona a minha mente, os pensamentos mandões serão majoritariamente os meus, e não mais os dos outros. Eis aí uma grande chave.