Meus vizinhos de andar possuem um gato chamado Tommy. Às vezes, o Tommy escapa e entra no meu apartamento.  Ele corre pela sala, pela cozinha e, quando passa diante do espelho no corredor, toma um susto daqueles! Enxerga sua imagem e se arrepia todo, as orelhas empinam, o rabo fica como um ponto de exclamação. Ele se prepara para atacar ou fugir. 

Assim como Tommy, muitos animais não dispõem da capacidade de reconhecer seu próprio reflexo no espelho. Uns acham que é outro bicho, outros sequer compreendem o que estão vendo. 

Com as pessoas, isso é diferente. A maioria de nós não só consegue identificar o reflexo no espelho, como também se reconhecer em retratos, filmagens, desenhos e até em caricaturas que só de longe lembram nossos traços. 

Mas se é tão fácil e intuitivo ter consciência das próprias características físicas, por que nem sempre acontece o mesmo com nossos traços internos? 

Se houvesse um espelho capaz de refletir o eu interior, aposto que muitas pessoas tomariam um susto. Tal como o Tommy, elas veriam alguém muito diferente do que acham que são. Ou, pior ainda, veriam apenas um amontoado de características incompreensíveis, uma forma difusa, um vulto de indivíduo. Mas por quê? 

Para a Ciência Logosófica, a maior parte da humanidade vive de maneira inconsciente. Ou seja, não dispõe de um espelho interno capaz de refletir os pensamentos, sentimentos, deficiências e virtudes. Vivemos, trabalhamos, sofremos e nos alegramos, lutamos e descansamos, mas pouquíssimas vezes paramos para efetivamente pensar sobre o ato de viver, de trabalhar, de sofrer e de se alegrar, de lutar e descansar. 

Segundo a Logosofia, é a consciência que funciona como esse espelho interno, no qual podemos ver refletidas as nossas próprias ações e, mais que isso, os pensamentos e sentimentos que as motivam. Mas, diferentemente de um espelho, a ação da consciência não é passiva, mecânica e nem automática. É necessário conhecimento e esforço para conseguir ativá-la. Viver uma vida consciente, pelo menos de acordo com a concepção logosófica, significa primeiro viver uma vida dedicada à busca por conhecimentos transcendentes. 

Por exemplo, um conhecimento transcendente que nos pode ajudar, e muito, na busca pela vida consciente é aquele relacionado aos pensamentos. O que são, como atuam, como nascem e morrem, e como diferenciar um pensamento da faculdade de pensar? Quando agimos ou falamos, o que existe por trás de nossos atos e palavras é um pensamento nosso, construído por nossa capacidade de pensar, ou é emprestado de alguém? Vivemos pelo nosso pensar ou pelo pensar de outros? 

A possibilidade de distinguir pensamento do ato de pensar é o que a Logosofia chama de princípio consciente. E é, de fato, o princípio de uma longa e bela trajetória de autoconhecimento e reflexão. A partir dele, podemos alcançar gamas cada vez mais transcendentes de conhecimentos sobre nosso mundo interno e as incríveis prerrogativas dos seres humanos nesse universo. 

Assim, quem sabe, quando colocarmos um gigantesco espelho diante da humanidade, ela não se assuste como o gato Tommy, mas possa se reconhecer e compreender quem realmente é. Mas isso, claro, só acontecerá se cada um de nós buscarmos individualmente transcender nossa condição inconsciente! 

 

 

 

 

“É preciso pensar; mas pensar bem, com fundamento, discriminando as situações com absoluta certeza e com serenidade de juízo, para saber qual é o melhor caminho a tomar. E, embora isso tenha uma perspectiva externa na vida dos seres humanos, existe também outra de imperiosa necessidade interna: a de pensar no que se é e pode chegar a ser, seguindo as diretivas da consciência.” Carlos Bernardo González Pecotche, Introdução ao Conhecimento Logosófico