Hoje em dia, quando as pessoas de minha convivência perguntam: “E aí, correndo demais? Trabalhando demais?” Minha resposta tem causado certa surpresa: “Eu trabalho em minha profissão só o suficiente, pois tenho muitas coisas importantes para fazer em minha vida.” Então o leitor poderá perguntar-se: “Mas trabalhar não é importante?” Nesse caso eu responderia que “sim, é muitíssimo importante o trabalho, mas essa importância e, principalmente, o valor moral e real desse trabalho, depende eminentemente do objetivo pelo qual se trabalha!”
Na infância, o conceito de trabalho que aprendi é de que o trabalho é nobre, que é uma luta diária, que é cansativo. “Dá um beijo no papai porque ele vai trabalhar, coitado!” , “trabalhar é bom, mas cansa demais!” O conceito que temos de trabalho desde que nascemos não é lá muito bom! Algo cansativo, enfadonho, pesado, desgastante, não é a parte boa da vida. Vida boa é aquela na qual se descansa, quando estamos de férias, quando viajamos a passeio, uma temporada na praia, etc. Ninguém está dizendo que essas coisas são ruins — é claro que não —, mas tenho tentado fazer algumas reflexões um pouco mais profundas a respeito.
Como o Universo, essa maravilha da Criação que não foi inventada pelo homem, funciona? O Sol tira uma folga de vez em quando? A Terra interrompe, sequer por um instante, seus movimentos naturais? Imaginem se nosso coração tirasse uma semana de férias? Vocês conhecem algum bem-te-vi que deixa, por qualquer motivo, seu ninho inacabado e diz: “Cansei, vou descansar, não quero mais saber de trabalho”!?
Nada, nadinha na natureza pára! Se parasse, seria um processo interrompido e uma degeneração imediata ou semi-imediata, é assim que funciona.
E o homem?
Como parte da Criação e da Natureza, não está subordinado às mesmas Leis Universais?
Todos os dias a Natureza nos mostra sua continuidade, sua constância, sua repetição e, principalmente, sua evolução.
Então, eu me pergunto: por que será que o homem, único ser na Criação dotado simultaneamente de inteligência, consciência e vontade, quer parar? Por que queremos o descanso eterno, a aposentadoria, o dolce far niente? O que nos move a preferir a inércia ao trabalho?
Tenho aprendido, através da concepção logosófica de vida e existência, que o problema está nos conceitos que foram estabelecidos pela cultura na qual vivemos. O que ocorre é que a Natureza, a Criação, o Universo — que contêm em si uma beleza,
uma pureza e uma nobreza infinitas — dizem-nos uma coisa e nós ensinamos às nossas crianças outras coisas. Ensinamos o contrário quando festejamos com elas a chegada das férias, a falta de luta na vida, quando estimulamos e valorizamos, em nossas próprias vidas, a proximidade de qualquer momento de ócio, de inércia. Ensinamos o contrário quando nos rebelamos contra qualquer tipo de atividade que nos demande alguma luta e desafio. Não reclamamos se o movimento é MRU = movimento retilíneo uniforme = INÉRCIA!
Mas trabalhar tanto…. para que mesmo? Para ganhar dinheiro? Para acumular, para dominar, para parecer melhor que o outro, para ter isso, aquilo e aquilo mais? E para que ter tanta coisa se daqui a alguns anos vou morrer?
Eis aí a grande questão da imponência do ócio e da inércia no ser humano sobre a atividade consciente e inteligente: a falta de conhecimento e as crenças existentes sobre a morte.
Afinal, para que realizar tanto, trabalhar tanto, lutar tanto se depois vou morrer?
Viver para morrer ou viver para ser eterno?
O mortal é aquele que trabalhou só para si mesmo, pelo acúmulo de bens materiais para si e para sua família — igualmente egoísta — e que, da fortuna que fomentou a vida toda, repartiu migalhas por aqui e por ali para ser bem visto e não ser taxado de usurpador por onde passasse.
E o imortal?
O imortal, ao contrário, é aquele que, depois de aprender a bastar-se a si mesmo física, moral e intelectualmente, a sustentar dignamente sua vida interna, familiar e social, dedica seu tempo também a trabalhar para construir um mundo melhor, para colaborar na construção de uma nova cultura que ensine algo diferente às crianças, que ensine a elas o valor da generosidade, da decência, da dignidade, que lhes estimule na obtenção dos conhecimentos sobre os verdadeiros e reais valores do homem, e que os tornarão igualmente imortais.
Agora, o mais interessante disso tudo é que, mesmo para aqueles que fizerem a escolha pela vida mortal, o Universo reserva-lhes uma surpresa. O físico, sendo a única coisa que lhes resta, ao desintegrar-se após sua morte, transformar-se-á… Os átomos que conformaram aquele corpo não morrem, eles transformam-se e continuam obedecendo sempre a todas as Leis do Universo, inexoráveis, diga-se de passagem, em sua constante atividade e trabalho, sempre!