Toca o despertador. Começa um novo dia. Abro a porta e recolho o jornal de hoje – sim, ainda gostamos do jornal em papel por aqui, por incrível que pareça! As manchetes parecem variar pouco – notícias que remetem a conflitos, disputas, guerras, dramas humanos e situações desalentadoras.

 

Cada um de nós já deve ter se perguntado muitas vezes: o que está por trás disso que se repete ao longo de anos, décadas e talvez séculos? Os atores mudam, mas o cenário e o roteiro sofrem muito poucas alterações. Por vezes parece que está até pior. Parece haver algo, que vai além do tempo e que mantém essa tensão constante, indo além das circunstâncias.

 

Como explicar essa realidade que costuma abater os ânimos (e o meu também)? Descobrir as suas causas não poderia colaborar para que algo fosse feito para sua superação? De quem depende trabalhar para uma mudança?

 

Ao mesmo tempo, parece que há algo dentro de nós que reclama uma outra realidade. A busca de uma vinculação entre os seres humanos parece também ser um desses temas que sempre inquietou a humanidade. Quantas culturas e linhas de pensamentos destacaram essa busca de uma união entre os homens – sem, entretanto, conseguir alcançá-la! Por que razão? Por que essas mesmas palavras bonitas são tantas vezes acompanhadas de ações violentas e trágicas, mesmo em nome daquilo que seria o mais elevado?

 

Recordei de quando eu era criança e lembrei que, quando era projetada uma imagem da possibilidade de formar um novo mundo – que pudesse ser presidido pela união de todos –, aquilo me calava fundo no coração. O que havia lá? A inocência da alma? A pureza do espírito sendo atraída pela busca dessa vinculação?

 

Parece que a vinculação entre os seres humanos é como uma lei natural, ainda que isso pareça paradoxal diante do que observamos no mundo. Existiria um atavismo latente de se integrar uma familia humana, uma pátria incorpórea em que a vinculação entre os corações humanos se possa estabelecer? Mas por que, depois, isso parece tão inalcançável? O que é que pode, de verdade, promover a vinculação entre os seres humanos?

 

Certamente essas explicações não podem ser encontradas olhando apenas a superfície do que se apresenta. E o mesmo parece acontecer no mundo e dentro de nós.

A Logosofia tem aberto para mim uma nova perspectiva com relação a esses dilemas, ao apresentar a realidade dos pensamentos.

 

Sim, estamos em um mundo em que imperam os pensamentos! Podemos observar isso dentro de nós mesmos – quando atuamos em oposição ao que julgamos bom, quando algo se manifesta com força dentro de nós, provocando conflitos até mesmo quanto ao que pensamos e sentimos. Uma verdadeira conflagração que os demais podem até não perceber, mas que nos coloca num verdadeiro inferno!

 

Ao reconhecer essa realidade dentro de mim, fui começando a poder identificar que estamos, nada mais, nada menos, do que diante de uma luta entre correntes mentais. Correntes que se contrapõem continuamente; e mais: que fazem isso dentro de nós, impedindo-nos de avançar.

 

Essa luta, que aparece no jornal e também dentro de mim está no mundo mental – mas onde está esse mundo mental, e como o podemos acessar?

 

Identificando a realidade dos pensamentos, fui percebendo, cada vez com mais clareza, quais são os que, dentro de mim, impedem qualquer vinculação e insistem em separar tudo: a mente do coração; a alma do espírito; a mim dos demais; a toda a humanidade entre si e de Deus.

 

Parece que, quando deixo um dos pensamentos que promovem a separatividade se manifestar, estou na verdade dando um pedaço do meu mundo interno para que o mal possa dominar um pouco mais. Reforço a corrente mental que impede a vinculação.

No entanto, a Logosofia também me tem ensinado a reconhecer outras partes desse mundo interno que há em nós, e tenho comprovado que existe um lugar que, a despeito de tudo, mantém-se intacto; esse ponto, que está latente em nós, remete-nos a uma outra possibilidade de conexão mental e espiritual. Havia algo da manifestação desse ponto nos ideais de criança que recordo com nostalgia? Ele era real?

 

Pois bem, mas como mudar o sentido de conexão a essas forças? Tenho descoberto que isso envolve a busca de viver uma vida muito mais consciente. Quero pôr em ação a consciência e, para isso, parece que tenho de recordar a cada dia: quem é mesmo que eu sou? O que estou fazendo aqui? O que deve viver em mim? E, ao buscar a mim mesma, descubro e identifico o que atrapalha essa conexão – o que tenho que superar!

No esforço em estar presente em mim mesma (em minha mente e em meu coração), vou ouvindo uma voz que é sutil, mas que me traz a consciência presente – que se diferencia muito do barulho mental da algazarra de pensamentos que argumentam e discutem com violência dentro de mim.

 

Nesse caminho, tenho descoberto que devo inverter vários hábitos que se tornaram moldes mentais, para me colocar a serviço da superação humana. Novas perspectivas têm apresentado-se ao mudar o sentido das reflexões comuns – deixar a análise apenas do que acontece fora e buscar as causas dentro – , o ponto de apoio que está no mundo íntimo. Um outro esforço é o de me fazer questionamentos quando identifico que está preponderando o que separa – e eu tenho de lutar (todos os dias) para derrubar as barreiras que setorizam as partes da minha vida e que me separam de mim mesma no final.

 

Ao realizar esses movimentos, tenho dado-me conta de que tudo o que em aparência está separado, na verdade, conforma um todo. Que a superação individual é imprescindível para a superação humana. E que, quando aprendo algo nesse caminho, tenho algo vivo para oferecer aos demais e ao mundo. Então, seria a depuração interna o primeiro passo para que a vinculação espiritual entre os seres humanos se possa estabelecer?

 

Em tudo isso, tem ficado claro que é possível a conexão a uma corrente mental de outra natureza, que traz energia e luz e que me estimula a buscar avançar na minha superação para poder ser veículo de sua força e expansão. Nesse percurso, tenho comprovado que as disciplinas e diretrizes do método logosófico são ferramentas essenciais para tal superação.

 

Mas o trabalho é incessante – de ampliação da capacidade mental, de luta contínua contra o mal (especialmente aquele que está dentro de mim), de esforços para que a razão superior presida, para que o espírito esteja presente. Os resultados, porém, superam todo o esforço enormemente – há algo que potencializa o que conseguimos empenhar, vinculando esses movimentos a um nível superior.

 

Ter essa visão faz com que a esperança e a confiança retornem e permite vislumbrar uma outra possibilidade de organização humana, unindo-nos a um grande (e possível) ideal.

Ao final, outras manchetes poderão talvez se projetar nos jornais do futuro, mas o primeiro passo está dentro de mim.