Aperfeiçoamento

1 – Acepção do vocábulo “igualdade” – Concepção logosófica das palavras

maio de 2019 - 7 min de leitura
Aperfeiçoamento

1 – Acepção do vocábulo “igualdade” – Concepção logosófica das palavras

maio de 2019 - 7 min de leitura

Igualdade. – Conformidade de uma coisa com outra em natureza, forma, qualidade ou quantidade. Correspondência e proporção que resulta de muitas partes que uniformemente compõem um todo. Perante a lei: princípio que reconhece para todos os cidadãos a capacidade para os mesmos
direitos. (Diccionario Enciclopédico Espasa-Calpe e Diccionario Real Academia Española.)

O conceito de igualdade, pela diversidade de critérios que o sustentam, é, sem dúvida, o que tem promovido mais discussões no seio da
sociedade humana.

Invoca-se a igualdade ao amparo de leis sociais e, mais significativamente ainda, ali onde a diferença de classes põe à mostra os desamparados da fortuna, clamando por um tratamento similar ao que desfrutam as camadas superiores. O comunismo, que destituiu os czares da Rússia e lançou por terra a aristocracia desse povo, foi uma explosão do conceito de igualdade que irrompeu violentamente em todos os âmbitos de seu território,
derrubando e exterminando, com a pretensão de submeter todos à igualdade sonhada pelos líderes da revolução, qualquer vestígio de privilégio que pudesse existir. A experiência, parte viva da realidade, que não se pode negar sob pena de cair na necedade, foi modificando o primitivo conceito do bolchevismo, até adequá-lo a formas mais aceitáveis para a organização social daquele país. Por mais que os homens se afastem da realidade, ela sempre acaba por reaproximá-los.

O conceito de igualdade, em sua mais ampla acepção, ou seja, em seu conteúdo universal, difere muito do comum. Sua essência deve ser buscada nas origens do gênero humano; melhor ainda, nas origens da vida como veículo de manifestação da alma, que cumpre sucessivos períodos de evolução através de épocas e idades, até realizar sua perfeição.

Tudo indica que a presença do homem no mundo, reproduzida num sem-número de seres, foi idêntica em sua primeira manifestação, ou seja,
no ponto de partida; porém, essa igualdade teve de sofrer uma série de modificações à medida que os seres foram se afastando daquele ponto inicial. Embora seja certo que foi dado a todos um destino comum, depreende-se, da abundância de fatos que atestam a exatidão de nossas afirmações, que esse destino só é fatal para os pobres de espírito, para os que nascem e terminam seus dias neste mundo mais ou menos como acontece na espécie animal. Desde o alvorecer da humanidade, os aborígines, indígenas e todas aquelas tribos nômades têm um destino comum prefixado, o qual, com pequeníssimas variações, é quase idêntico para todos, já que poucas vezes são capazes de ultrapassar a meta estabelecida. Porém, logo que o homem conseguiu despertar para conhecimentos que superavam consideravelmente os primitivos, deu-se conta do muito que podia ser feito para melhorar a existência e alcançar destinos melhores.

A história humana é uma longa, interminável sucessão de relatos que descrevem os triunfos do homem nos diversos campos em que lhe foi possível atuar como ente dotado de inteligência e sensibilidade. Esses mesmos triunfos assinalam contínuos progressos, num constante empenho para ampliar suas perspectivas e alcançar um maior domínio sobre os elementos, o que foi transformando a terra, através de sucessivas etapas, num mundo civilizado e apto para toda classe de atividades que pudessem facilitar com amplidão a evolução humana.

Evidentemente, esses progressos denotam já uma mudança, tão visível quanto convincente, daquele destino comum das primeiras idades, em que a incipiente reflexão não acusava maiores aspirações. No entanto, a palavra destino contém a trajetória que o ser humano pode seguir até a mais alta ascensão. Daí o desenvolvimento verificado entre os seres dotados de razão, os quais, não obstante serem aparentemente similares entre si, se acham a diferentes e até mesmo grandes distâncias uns dos outros, segundo o grau de evolução individualmente alcançado.

A igualdade é uma lei inexorável, e deve se entender que, como tal, não pode violar outras leis, pois todas se complementam, fazendo possível o equilíbrio do Universo.

A lei de igualdade significa, então, que as mesmas perspectivas vigorarão para aqueles que se achem em iguais condições, e que eles poderão desfrutar os mesmos direitos e prerrogativas enquanto não exista alteração no ponto de igualdade em que temporariamente se encontrem. Se cem ou mil pessoas começam uma longa viagem a pé, nem todas caminharão com idêntica desenvoltura, energia e velocidade. Porém, o fato de uns cobrirem uma etapa em menor tempo que outros não quer dizer que os que ficarem atrás não poderão alcançá-los, e, caso isto aconteça, estarão novamente em igualdade de condições. Estarão no mesmo lugar, desfrutando análogas perspectivas.

Algo semelhante é o que acontece no trajeto que se percorre através da existência: dois ou mais seres podem estar no mesmo grau de evolução; em tal caso, suas condições e prerrogativas serão iguais, mas se entende que o serão enquanto permaneçam nesse grau de evolução, já que, desde o momento em que qualquer um deles o transcenda, essa igualdade ficará, logicamente, alterada. Vemos aqui a amplitude desta concepção que define a igualdade.

Outra imagem de grande conteúdo, que haverá de ilustrar em outro aspecto o significado da palavra igualdade e nos demonstrar como esta, sem perder sua força, se manifesta tal como deve ser concebida pela inteligência que sabe descobri-la ali onde sua presença pode dar mais um motivo para reflexão, é-nos apresentada por uma família numerosa, cujos filhos nasceram em igualdade de condições e aos quais foi oferecido o mesmo amor, o mesmo alimento, o mesmo ar. Todos viveram, além disso, no mesmo lar e receberam idêntica educação. A igualdade, pois, não poderia ser posta de manifesto com maior eloquência; não obstante, cada um deles tomou rumos diferentes: um seguiu uma carreira e escalou posições de destaque; outro seguiu um ofício; aquele se tornou navegante, e houve os que não quiseram estudar nem trabalhar e preferiram a vadiagem, c chegando alguns, pelos caminhos do vício, até o cárcere.

Quem alterou aqui a igualdade? Quem poderia, sensatamente, pretender retornar à igualdade todos esses filhos, colocando-os no mesmo plano,
numa posição similar e gozando iguais prerrogativas? A igualdade existiu, neste caso, durante um tempo, mas depois foi alterada por obra de cada um.

Aí está a verdadeira igualdade; a sábia, a justa, a inquestionável; a que oferece a todos a mesma oportunidade.

O propósito humano não deve tender jamais a buscar a igualdade pela violência ou por meios arbitrários, pois conseguir isso traria uma igualdade injusta ou, pior ainda, uma simulação de igualdade.

Todo homem deve procurar igualar-se a quem, por seus esforços ou por qualquer circunstância que ele ignore, esteja acima dele. A igualdade deve ser concebida num plano de equidade e de justiça, e aquele que se encontrar embaixo deve ascender até onde se achar o que estiver em cima, se é a este que ele quer se igualar. Quem se inicia na carreira militar, por exemplo, sabe que só pela realização e pelo estudo haverá de ir conquistando suas patentes e alcançando cada um de seus superiores nas respectivas posições hierárquicas, até se igualar ao que tem as insígnias de general. Mas para isso lhe será necessário ser também um general. Seria absurdo que o militar incipiente pretendesse que o de maior posição hierárquica o igualasse, retrocedendo até colocar-se em sua posição, quando é a ele que cabe efetuar a trajetória ascendente que o levará a igualar-se a seu superior.

A igualdade deve constituir o supremo anelo da alma humana, a suprema aspiração; mas, para que isso tenha toda a força necessária, a fim de encarnar um grande ideal, deve-se entender que esta igualdade terá de ser obtida quase que exclusivamente por esforço próprio e representar o objetivo essencial, qual seja se igualar àquele que é mais no sentido amplo da palavra.

A igualdade como forma jurídica de Direito Universal tem que existir e existe, adaptada aos meios de convivência social em que se aglutinam os diferentes tipos que integram a sociedade humana nos respectivos países; entretanto, essa igualdade é mais aparente que real; estabelece um modus vivendi aceito sem maiores razões – e isto é paradoxal –, porque o exigem as normas toleradas pela própria sociedade.

A proeminência nas posições políticas, sociais e econômicas estabelece de fato privilégios que, por certo, não desfrutam os que se acham em posições inferiores. Por outro lado, as relações e vínculos de toda ordem entre os seres permitem também alcançar vantagens que aquele
que esteja totalmente isolado dos demais não obtém. Apesar disso, ninguém poderá afirmar que exista alguém a quem as leis, que vigoram para todos em perfeita igualdade de rigor, tenham negado a possibilidade de conquistar posições e desfrutar idênticos privilégios.

Em suma: a igualdade é uma lei de ordem universal que dá ao homem a compreensão do que é, conforme o lugar ou posição em que esteja situado. Segundo o dizer bíblico, Deus fez o homem à sua imagem e semelhança; isto não quer dizer que o fez igual a Ele, mas lhe deu a entender que a igualdade era o caminho que devia percorrer até alcançar sua imagem e semelhança.

Photo by Brett Zeck on Unsplash


Um pensamento de

 Carlos Bernardo González Pecotche (Raumsol)
Carlos Bernardo González Pecotche, também conhecido pelo pseudônimo Raumsol, foi um pensador e humanista argentino, criador da Fundação Logosófica e da Logosofia, ciência por ela difundida. Nasceu em Buenos Aires, em 11 de agosto de 1901 e faleceu em 4 de abril de 1963. Autor de uma vasta bibliografia, pronunciou também inúmeras conferências e aulas. Demonstra sua técnica pedagógica excepcional por meio do método original da Logosofia, que ensina a desvendar os grandes enigmas da vida humana e universal. O legado de sua obra abre o caminho para uma nova cultura e o advento de uma nova civilização que ele denominou “civilização do espírito”.

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