Outro dia fui jantar com um amigo que me relatou um problema familiar que vivia há alguns anos. Esse problema não era novidade para mim, mas naquele momento algo diferente aconteceu. Em vez de tentar entender as razões pelas quais meu amigo estava passando por aquilo, o que poderia levar a julgamentos desnecessários, simplesmente consenti com ele e busquei dentro de mim algo que pudesse ajudá-lo. Relatei a ele uma experiência vivida por um parente meu e como isso nos poderia ajudar a entender a situação. Senti que isso aliviou um pouco o peso do que o meu amigo sentia naquele momento, criando um ambiente especial, típico de uma verdadeira amizade. Conversamos sobre isso e muitas outras coisas por um bom tempo e voltamos para casa com uma leve sensação de felicidade.
Mas o que aconteceu ali durante aquele jantar? Eu valorizo muito esse amigo, mas nem sempre me senti assim ao encontrá-lo. Pensei na importância da amizade, que considero um sentimento essencial para a vida de todo ser humano. Apesar dessa unanimidade, parece que a verdadeira amizade esconde alguns segredos que precisamos desvendar para que ela realmente floresça. Pensando nisso recordei do conceito logosófico de amizade:
A amizade, tal qual é no fundo e em sua singeleza, equivale ao afeto que, nascendo no coração dos seres humanos, emancipa-se de toda mesquinhez e interesse, enaltecendo e enobrecendo o pensamento e o sentimento dos homens. (Coletânea da Revista Logosofia – Tomo II, p. 1)
Muitos provavelmente dirão que isso é muito raro e eu tendo a concordar. No entanto, essa recordação levou-me a refletir que, naquele jantar, experimentei exatamente isso: a emancipação do afeto de toda mesquinhez e interesse, permitindo que se enobrecessem meu pensamento e meu sentimento.
Indo mais a fundo nessa experiência, e procurando entender como a reproduzir mais vezes, tomei contato com outro ensinamento logosófico que diz que
Não se poderia conceber a amizade se ela não fosse presidida pelo ternário simpatia-confiança-respeito, indispensável para nutrir o sentir que a constitui. (Coletânea da Revista Logosofia – Tomo II, p. 1)
Parece que aqui está uma chave para fazer surgir essa verdadeira amizade que tanto buscamos. Mas por que esses três elementos são indispensáveis para que ela surja? O cultivo da simpatia parece criar ao nosso redor um ambiente diferente, propício ao surgimento de novos vínculos. Aprendi com a Logosofia que isso ocorre porque a simpatia é o centro gerador do afeto. Já o respeito, parece ser o elemento responsável por proteger esse afeto. Aprendi também que o respeito sem afeto torna-se rígido, e que o afeto sem respeito debilita-se facilmente. O afeto nascido da simpatia e o respeito parecem completar-se perfeitamente. Mas e a confiança? Esta não surge de uma hora para outra. Às vezes, ela aparece e, outras vezes, não. Por que será? Comumente, acredita-se que a confiança é uma consequência natural da convivência, desenvolvendo-se com o tempo. Mas será que é assim tão natural o seu surgimento?
A confiança é uma força que é necessário cultivar e utilizar com sabedoria. É a confiança em si mesmo que irradia para os outros e determina se confiam em nós. Mas como possuir essa confiança? De onde ela surge? Ao olhar para o meu mundo interno, às vezes parece difícil encontrar algo permanente em que eu possa verdadeiramente confiar. No entanto, à medida que elimino o que em mim mesmo desagrada, essa confiança começa a emergir. Assim, minha verdadeira individualidade, aquilo que compõe a minha essência, revela-se. Essa confiança, constituída em força moral, transmite-se por meio de palavras e ações, sendo captada pelos demais.
Compreendi isso ao estudar o conceito de confiança apresentado pela Logosofia:
Do ponto de vista de sua expressão ética, a confiança é o terreno moral que, partindo de nossa intimidade, se estende até circundar o que forma o conjunto de nosso ser. Assim, o espírito, a alma, a mente e o corpo se acham penetrados dessa essência moral que constitui, em resumo, o fundo característico de toda individualidade. (Coletânea da Revista Logosofia – Tomo II, p. 51)
A amizade que nasce do afeto gerado pela simpatia, protegida pelo respeito, fortalece-se com a confiança que abrange a totalidade do nosso ser. Dessa forma, a amizade emancipa-se e eleva-se. E todas essas reflexões surgiram do estudo das experiências vividas naquele simples jantar…